A Maria é professora. E também é estúpida. Ela sabe que é estúpida porque o João, o seu marido, lho diz. Explica sempre tudo o que a Maria expressa. E o João sabe o que diz. O João não tem nenhuma formação específica e prefere o café ao trabalho. Mas o João não é estúpido porque é homem e os homens não são estúpidos.
A Raquel tem 50 anos. A Raquel é velha. Ela sabe que é velha porque o Pedro, o seu companheiro, a esclarece com frequência. Aponta lhe os cabelos brancos, as rugas no rosto, a flacidez das mamas. O Pedro tem 55 anos. Tem cabelos grisalhos, duplo queixo e a barriga já lhe encobre a pouca masculinidade. Mas o Pedro não é velho porque é homem e os homens não envelhecem.
A Filipa é estudante. E é puta. Ela sabe que é puta porque o Miguel, o seu namorado, lho explica. Às vezes com manifestações físicas: já lhe rasgou o decote de um top, já lhe esfregou o batom pelo rosto, já a proibiu de usar certas saias. O Miguel implora sexo a tudo o que mexe, oferece-se em praça pública, exibe-se em tronco nu. Mas o Miguel não é puta porque é homem e os homens não são putas.
A Bárbara é uma mulher realizada. E é infeliz. Ela sabe que é infeliz porque a Joana, a sua mãe, a informa constantemente. Precisas de alguém que te faça feliz, repete. A Joana é casada com o Raul, pai da Bárbara. O Raul é um adúltero que se diverte a abusar psicologicamente da Joana. Continua casado por cobardia. Sente um desprezo natural pela inércia da companheira. Mas a Joana não é infeliz porque ‘tem’ um homem e quem ‘tem’ um homem não é infeliz.
(Texto de Ruth Martins, via Happiness)
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