Lutador contra o Salazarismo, independente de partidos e de ideologias, privilegiou a acção. Tornou-se conhecido pelo primeiro desvio político de um avião, em 1961. E pelo assalto ao banco da Figueira da Foz, em 1967.
E, de repente, milhares de panfletos são lançados sobre Lisboa, a partir de um avião da TAP. Era o dia 11 de Novembro de 1961, estava-se em plena ditadura Salazarista, na véspera de eleições legislativas para o parlamento do Estado Novo e os lisboetas, espantados, viam cair-lhes do céu folhetos exortando-os a derrubar o regime.
O "Super-Constellation" da TAP fora desviado por um comando antifascista, dirigido por um ex-sargento da Força Aérea, de nome Hermínio da Palma Inácio. Esta acção iria tornar internacionalmente célebre este algarvio aventureiro - o qual, a partir dessa data, se torna também num dos maiores inimigos do regime do Estado Novo. A acção tinha antecedentes vários, no campo da resistência política e no campo da aventura pura.
Quinze anos antes, com pouco mais de 20 anos, ia a II Guerra Mundial no final, estava ele na Força Aérea. O racionamento de guerra apertava. Hermínio pegava num avião Tiger, do Air Clube de Sintra, dirigia-se primeiro a norte, à Figueira da Foz (uma cidade que fará, depois, parte da sua história de vida), onde abastecia a pequena aeronave de bacalhau - após o que virava rumo sul, a Tunes, no Algarve, e picava sobre a casa da mãe largando fardos de bacalhau e ramos de flores. Quase 20 anos antes dos panfletos sobre Lisboa.
A aventura política a sério começa depois do final da guerra, em 1947. Nascido numa família pobre e vivendo no meio dos ferroviários de Tunes, um meio politizado, Hermínio envolve-se numa tentativa de golpe militar contra Salazar.
Conhecedor da base aérea de Sintra, onde servira como mecânico-militar, Hermínio é aliciado para neutralizar os aviões de Sintra. Com a frieza e a ousadia que se tornariam uma imagem de marca, ele entra com a maior naturalidade e na companhia de outro mecânico amigo e comparsa e cortam com alicate os cabos de comando dos aviões.
O golpe aborta. Palma Inácio esconde-se, mas acaba por obter o seu baptismo de fogo nas prisões políticas do regime. É reconhecido e denunciado... e preso pela primeira vez. Na cadeia do Aljube, em Lisboa, resiste durante meses à tortura (e à tentativa de aliciamento para o PCP), sem denunciar ninguém, e consegue uma fuga - espectacular, de novo... - saltando de uma janela da casa de banho, com a ajuda de lençóis. O mito do aventureiro e resistente cresce.
Hermínio foge, de novo, agora num cargueiro, para Marrocos. É aliciado, sem sucesso, para a Legião Estrangeira, mas sonha com os Estados Unidos. Trabalha num cargueiro sueco, chega a Estocolmo e, daí, trabalhando num paquete, à América. Estava-se no ano de 1951 e Hermínio tem 29 anos. Vive nos Estados Unidos como clandestino durante alguns anos, até que os serviços de emigração o detêm. Uma amiga consegue que um senador influente evite a sua extradição para Portugal. O Brasil é o seu próximo porto.
No Rio de Janeiro torna-se empresário, segue as eleições presidenciais de 1958 em Portugal e a saga de Humberto Delgado - e aí, pouco tempo depois, conhece Delgado, exilado político após as eleições, e Henrique Galvão, refugiado político após a aventura da tomada do paquete Santa Maria (outro dos golpes espectaculares contra o regime de Salazar). E regressa à conspiração.
No Verão de 1961, Hermínio está de novo em Marrocos, envolvido na tentativa de golpe militar (o golpe de Beja) contra a ditadura. Falhada esta, lança-se na sua primeira grande acção 'mediática': o desvio do avião da TAP. Após isso, deixa o Brasil e vai para Paris. Continua conspirando, até ao dia em que a "Operação Mondego", a sua segunda grande acção espectacular, está pronta a avançar. Estruturada a primeira organização armada anti-regime, a LUAR, ele e mais três "guerreiros" (Camilo Mortágua, Barracosa e Luís Benvindo) partem para Portugal. A 17 de Maio, assaltam o Banco de Portugal da Figueira da Foz, de onde levam 30 mil contos, quantia grossa para a época. Uma avioneta os espera no aeródromo de Cernache. Fogem para o Algarve e depois... Paris, de novo. Por causa do reconhecimento das notas roubadas, é preso em Paris. Evita a extradição, envolve-se na conspiração uma vez mais, passa pelos países comunistas, sem que o comunismo o atraia, consegue armamento para a ETA, no tempo de Franco. Em 1968, Hermínio regressa a Portugal. Trata-se de nova acção, a tomada da cidade da Covilhã por algumas horas. Mas a operação falha. Hermínio regressa às cadeias políticas do regime, a Caxias, depois de reconhecido já na região transmontana. Em Caxias é de novo torturado e de onde consegue nova e espectacular fuga. Depois, a exílio activo na Europa. E a conspiração, sem olhar a filiações partidárias, a acção pela acção. Em 1973, entra de novo em Portugal, para raptar algumas figuras do regime a troco da libertação dos presos políticos. A aventura fica pela intenção. É detido de novo e será em Caxias que o 25 de Abril o encontrará. Depois dessa data, acaba por filiar-se no PS do seu amigo e protector Mário Soares, a primeira ligação partidária em toda uma vida de acção e de aventura.
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