Destas mãos que falam, saem gritos d'alma, gemidos de dor, às vezes, letras com amor, pedaços da vida, por vezes sofrida, d'um quase iletrado escritor. Saem inquietações, também provocações, com sabor, a laranjas ou limões. Destas mãos que falam, saem letras perdidas, revoltas não contidas, contra opressões, das nossas vidas! (Alberto João)

segunda-feira, 27 de maio de 2024

SOBRE OS SALOIOS



 Um dos seus meios de transporte preferidos era o pachorrento burro, companheiro precioso, aparelhado com albardão para os serviços do campo, com albarda para uma simples viagem, e com almantricha para o transporte de qualquer saloia rica.

Por vezes aparece com ceirões de esparto semelhantes aos de Marrocos, ou de albardão mourisco, com arção em meia-lua.
O jumento é um amigo fiel, um meio seguro de locomoção, nada caro, pouco exigente e razoavelmente rápido para as andanças da época.
Por seu lado, o vestuário também evoluiu.
Por estas bandas de Odivelas – Loures, no século XIX, já aparecia muita gente vestida “à cidade”, embora a gente da terra e com raízes de avós e bisavós aqui bem lançadas, apenas admitisse uma leve evolução no vestuário.
Como por toda a parte, havia sempre uma certa diferença entre o vestuário habitual e o de “ver a Deus” ou de festa.
Também o saloio janota, com peneiras e a aproximar-se da cidade, arranjava andaina mais catita.
De colete, jaleca azul e botas brancas, faixa e carapuço pretos, fazia um vistão.
Barretes verdes, poucos se viam, mas chapéus desabados à Mazantini, esses apareciam sobretudo em dias de festa nas feiras e romarias.
Nos actos solenes, um capote azul, parecido com o albornoz mourisco, dava-lhe uma certa imponência.
Em tempos relativamente modernos, há uns cem anos, já apareciam as calças de “boca-de-sino”, justas às pernas e alargadas em baixo, cinta preta para os casados e encarnada para os solteiros, jaleca a contornar os quadris, camisa mole sem gravata, colarinho mole e barrete de borla preta para os casados e encarnada para os solteiros.
O barrete, à entrada da igreja, era deixado no muro das carapuças; agora o chapéu à Mazantini esse era verdadeiramente estimado e não saía das mãos do seu dono, pois aguentava, ordinariamente, uma vida inteira.
De aba larga e copa redonda, dava a cada saloio rico – pois eram esses os que o usavam – um verdadeiro ar de grande senhor.

(António Fernando Serra)



 

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"Horta do Zorate" é o blogue pessoal de Alberto João (Catujaleno), cidadão do mundo em autoconstrução desde 1958.