Destas mãos que falam, saem gritos d'alma, gemidos de dor, às vezes, letras com amor, pedaços da vida, por vezes sofrida, d'um quase iletrado escritor. Saem inquietações, também provocações, com sabor, a laranjas ou limões. Destas mãos que falam, saem letras perdidas, revoltas não contidas, contra opressões, das nossas vidas! (Alberto João)

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

A penosa caminhada de Manuel Alegre...

«Manuel Alegre, em fim de carreira política (que no fundo se resume a trinta e tal anos sentado no Parlamento), candidatou-se à presidência da República acalentando o sonho de ser o Hugo Chávez português, o cavaleiro andante do "socialismo do século XXI", o quebra-bilhas da Europa capitalista.


Mas, para sua desdita, o poeta não tem os pergaminhos de militar de carreira do tenente-coronel venezuelano, nem Francisco Louçã, o seu inventor nesta segunda candidatura, tem força política para o levar ao colo até Belém.

Para Manuel Alegre, enquanto candidato à presidência da República, mais pesada que a derrota eleitoral de Janeiro próximo, foi a estrondosa derrota nas eleições legislativas de Setembro de 2009, há precisamente um ano.

O ex-deputado socialista apostou tudo na derrota do PS e num significativo crescimento eleitoral do Bloco. Procurou, ao lado de Louçã, no Teatro da Trindade e na Aula Magna, chamar ao BE os descontes de esquerda com a governação socialista e os órfãos partidários.

Não perdeu, então, uma única ocasião para se vilipendiar o partido onde sempre se abrigou, ameaçando dia sim, dia não com a formação de outro partido.

O sonho parecia simples e exequível: 1) um PS derrotado, em crise e à beira da implosão; 2) um BE forte, com 17 ou 18%; e Manuela Ferreira Leite a dirigir o governo e a aplicar duras medidas de austeridade.

Esta era a base de partida para o projecto "venezuelano": a vitória nas eleições presidenciais e a constituição de um partido socialista unificado, com o BE, destroços do PS e órfãos e descontentes de todas as matizes.

O PCP viria a reboque, tal como na Venezuela os comunistas andam a reboque do tenente-coronel e do seu "socialismo do século XXI" - uma mistela ideológica, onde a ambição pessoal ocupa um espaço privilegiado.

Raramente a realidade acompanha o sonho. A vitória de José Sócrates nas legislativas e o insuficiente resultado eleitoral do BE esburacaram a urdidura.

Agora, apenas assistimos a uma penosa caminhada de Manuela Alegre até Janeiro. Canta o guião como no sonho que inventou, fazendo eco dos discursos de Louçã, mas atabalhoado, sem alma, nem jeito, vazio, sem se dar conta da realidade.

A vitória do PS há um ano foi a derrota do sonho "presidencialista" e do projecto "socialismo do século XXI" da dupla Manuel Alegre-Francisco Louçã. José Sócrates percebeu isso desde o primeiro segundo. Por isso, mesmo fazendo-se rogado, deu-lhe tranquilamente o abraço de urso



Texto de Tomás Vasques, Expresso online, 29-9-2010
Cartoon de Henrique Monteiro

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