Destas mãos que falam, saem gritos d'alma, gemidos de dor, às vezes, letras com amor, pedaços da vida, por vezes sofrida, d'um quase iletrado escritor. Saem inquietações, também provocações, com sabor, a laranjas ou limões. Destas mãos que falam, saem letras perdidas, revoltas não contidas, contra opressões, das nossas vidas! (Alberto João)

sábado, 15 de novembro de 2008

Vida sexual de ficção impõe-se como ideal...


"Erotização da sociedade e dos bens mais insignificantes dita padrões de desempenho aos indivíduos e casais.
Todos mentem aos outros ou a si próprios quanto à actividade e satisfação sexual. A "culpa" será das mensagens erotizadas que se colam até às coisas mais comezinhas, numa sociedade que vê o sexo como um recurso finito.

A publicidade feita a bens tão simples como um iogurte generaliza a ideia de que o desempenho sexual de cada um deve ser perfeito, frequente e duradouro, mas a realidade será bem diferente. Apesar de as pessoas não o admitirem. Ou de só o confessarem em inquéritos, com a segurança do anonimato, e sob garantia do segredo profissional de médicos ou psicólogos. Elas estarão fartinhas do sexo. Pelo menos estarão cansadas de ter de cumprir os padrões mediatizados , inclusivé pelo cinema. Esta a perspectiva ontem transmitida por Stuart Walton, que ontem participou nas conferências "As Regras da Atracção", na Culturgest, comissariadas por Rui Trindade.

Segundo aquele ensaísta britânico, as consultas têm muita gente a queixar-se de cada vez fazer menos sexo. Mas, o que importará, segundo Stuart Walton, é que as pessoas, em vez de terapia, tenham mais tempo juntas, "tempo romântico, que pouco cabe nas vidas de rotina". Ainda na sua opinião, há a tendência para "um espírito de contabilista" quanto à periodicidade dos actos sexuais. Interroga-se Stuart Walton "por que razão tem de ser problema a falta de sexo e a necessidade deste não pode ir e vir como qualquer apetite?". O ensaísta considera também que havendo, numa relação prolongada, a tendência para a marginalização do sexo, este não pode ser o elemento definidor dessa relação. O sexo pode ter sido "o feriado", o que uniu o casal numa primeira fase e o desaparecimento do desejo pode ser natural. Até porque houve, entretanto o "efeito corrosivo" de realidades como a preocupação com os filhos e as rotinas diárias domésticas e do trabalho. Ainda assim, para essa fase, o conferencista aconselhou a "programar o sexo nessa vida atarefada".

Uma abordagem distinta foi feita pela socióloga Anália Torres, que falou dos vínculos emocionais e da forma como nas últimas décadas se reorganizaram os espaços da família, do amor e da relação com o trabalho. Afirmou a investigadora que se tem apostado mais no íntimo, o que constituirá uma espécie de refúgio, dado que cada vez se controla menos outras circunstâncias da vida, a começar pelo emprego. Anália Torres disse que nos últimos anos terem passado para a esfera pública questões antes ocultas. É o caso da interrupção voluntária da gravidez, da nova lei do divórcio, do casamento de pessoas do mesmo sexo, dos maus tratos a mulheres e crianças e da paternidade biológica e afectiva. Tudo questões que, curiosamente, surgiram nas sociedades espanhola e portuguesa em tempos quase simultâneos. "Tudo o que sucede em Espanha está também a acontecer cá", constatou Anália Torres para adiantar que "as pessoas reclamam direitos que antes pareciam não-reclamáveis".

Sublinhou a mesma socióloga que se gerou uma necessidade de compensação pondo ênfase no foro íntimo porque, apesar de maiores oportunidades individuais, também passou a haver maior risco e incerteza. Referindo dados recentes, Anália Torres lembrou que os europeus põem a família em primeiro lugar, seguida dos amigos, do lazer e trabalho. E admitiu ainda que a criança pode estar a ser vista como uma saída afectiva para as dificuldades emocionais entre os adultos. "
in JN online, 15-11-2008

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"Horta do Zorate" é o blogue pessoal de Alberto João (Catujaleno), cidadão do mundo em autoconstrução desde 1958.