Destas mãos que falam, saem gritos d'alma, gemidos de dor, às vezes, letras com amor, pedaços da vida, por vezes sofrida, d'um quase iletrado escritor. Saem inquietações, também provocações, com sabor, a laranjas ou limões. Destas mãos que falam, saem letras perdidas, revoltas não contidas, contra opressões, das nossas vidas! (Alberto João)

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Documentário mostra morte do doente Craig Ewert...

A morte em directo não é inédita na televisão. Por norma, ocorre velada, disfarçada, geralmente em cenários de conflito. Mas quando a morte é filmada, cara-a-cara, quando se capta o último suspiro de um homem que escolheu morrer a ficar à espera que a morte o colhesse, o Mundo pára para pensar. E discutir. Em Inglaterra, a polémica está instalada.

Esta quarta-feira, um canal de televisão britânico vai transmitir um documentário que acompanha os últimos dias de uma vida, os momentos finais de um ex-professor que escolheu ir à Suíça pedir ajuda para morrer. Realizado pelo canadiano John Zaritsky, capta o momento em que a viagem terminou para o americano Craig Ewert, em Setembro de 2006.



“Tenho duas hipóteses: se avançar com isto, morro, como aconteceria inevitavelmente; se não avançar com isto, essencialmente vou sofrer, infligir sofrimento à minha família e depois morrer, possivelmente de uma forma pior, sem possibilidade de escolha”. Palavras de Craig Ewert, a 23 de Setembro de 2006, durante os preparativos para a última viagem, que ocorreria três dias depois.

O documentário mostra Ewert a trocar um último beijo com a mulher, Mary, companheira de 37 anos e mãe dos dois filhos do casal. “Amo-te muito, querida”, despediu-se. “Faz uma boa viagem, vemo-nos no futuro”, respondeu a esposa.

Pagou 3500 euros para morrer
No vídeo vêem-se responsáveis da Dignitas, a associação suíça que presta assistência à morte de doentes terminais, a ministrar uma mistura letal de sedativos a Ewert. Ao som de Mozart, o paciente sorve um sumo de ananás e bebe a mistura que o levará a sucumbir. Pagou 4500 dólares (cerca de 3500 euros) para pôr fim ao sofrimento.

“Obrigado”, diz Ewert pouco ante de morrer. A esposa, Mary, defende a divulgação do documentário. “Ajudará muita gente a enfrentar os seus receios” e a vencer “os tabus” sobre a morte, acrescentou, em declarações à imprensa britânica.

Quem tem o direito a fazer o papel de Deus?
“Voyeurismo macabro”, da perspectiva dos grupos anti-eutanásia. “Trata-se de uma tentativa cínica de impulsionar a audiência televisiva”, acrescentou o director da associação “Assistência, não morte”, Peter Saunders.

“É triste e perigoso mostrar este tipo de documentários na televisão”, observou Domenica Roberts, da “Aliança Pró-Vida”. O canal televisivo, “Sky Real Lives” defende-se: “Trata-se de um filme eloquente e informativo, que aborda um assunto que afecta cada vez mais gente”, disse Barbara Gibson.

Mas pertence a Craig Ewert, que em vida escolheu morrer, a mais sentida e eloquente defesa da eutanásia. “Há gente que vai olhar para isto e dizer: o suicídio é errado, Deus proíbe-o. Mas, se tivesse vivido sem ajuda de tecnologia, já estaria morto agora. Quando os bebés prematuros nascem, sobrevivem porque os médicos fazem o papel de Deus. Os cristãos nunca dizem que é preciso acabar com o transplante de órgãos, que temos de deixar de ajudar os bebés prematuros. Para isso está bem fazer de Deus, mas quando se trata de acabar com o sofrimento de alguém, já dizem que não podemos fazer de Deus”.

Pais não vão ser julgados por morte de um filho de 23 anos
A emissão do documentário acontece numa altura de particular sensibilidade para o tema da eutanásia, no dia em que a Procuradoria-Geral de Inglaterra disse que não iria agir criminalmente contra os pais que ajudaram um jovem a morrer, na Suíça.

Daniel James, de 23 anos, morreu, em Setembro, numa clínica suíça, quase uma ano depois de ter ficado tetraplégico após uma lesão na coluna, durante um treino de râguebi. A promotoria não achou de interesse público julgar os pais por homicídio, apesar de ter detectado nas análises ao sangue do jovem uma quantidade elevada de barbitúricos, consistente com a possibilidade de uma morte assistida.

Primeiro-ministro britânico opõe-se à eutanásia
A título pessoal, o primeiro-ministro inglês, Gordon Brown, mostrou-se contra a eutanásia, mas não alinhou na tese do voyeurismo. “É muito importante que estes assuntos sejam acompanhados com sensibilidade se sensacionalismo e espero que os emissores do programa se lembrem de que têm um vasto leque de responsabilidades para com o público em geral”.

A lei no Reino Unido proíbe qualquer ajuda à morte, sendo a assistência prestada, ainda que a pedido expresso do enfermo, considerada homicídio. “Creio que é preciso assegurar que em caso algum neste país um doente ou uma pessoa idosa se sinta pressionada a concordar com morte assisitda ou que é isso que se espera dele”, disse Gordon Brown, em declarações à imprensa britânica. “É por isso que sempre me opus a legislação para morte assistida”, acrescentou.

Na Suíça a eutanásia não é criminalizada e muitas pessoas escolhem aquele país do centro da Europa como destino final, ou última paragem terrena. Segundo o Daily Telegraph, a “Dignitas” já ajudou mais de 100 britânicos a escolher a morte.
in JN online, 10-12-2008

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"Horta do Zorate" é o blogue pessoal de Alberto João (Catujaleno), cidadão do mundo em autoconstrução desde 1958.