Destas mãos que falam, saem gritos d'alma, gemidos de dor, às vezes, letras com amor, pedaços da vida, por vezes sofrida, d'um quase iletrado escritor. Saem inquietações, também provocações, com sabor, a laranjas ou limões. Destas mãos que falam, saem letras perdidas, revoltas não contidas, contra opressões, das nossas vidas! (Alberto João)

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

António Paixão: Polícia sinaleiro doutor em Políticas Sociais...



"António Paixão é o símbolo de uma profissão agora rara: polícia sinaleiro. Regula o trânsito, mas também apoia os idosos da zona. Quis aprender mais e foi para a universidade. É o primeiro polícia sinaleiro a tirar um curso.

A união entre os dois "amores" de António Paixão, trânsito e assistência social, teve ontem o seu corolário: A Universidade Aberta abriu as portas do seu Salão Nobre para fazer a entrega do diploma de curso exclusivamente ao Agente Paixão. Docentes e funcionários da universidade encheram a sala e a comunicação social deu cobertura ao evento. E o reitor, Carlos Reis, já no fim do discurso de entrega, até brincou: "Espero que agora não abra passagem ao trânsito no preciso momento em que o reitor estiver a atravessar a rua".

António Paixão estranha tanta atenção mediática, "deve ser porque somos poucos nesta função", mas reconhece que "ao longo dos anos tenho tentado mudar um pouco e esta profissão ajudou-me a crescer muito, mais ainda com este curso de Políticas Sociais". Agora, com o canudo na mão, o Agente Paixão acaba por admitir: "Confesso que estou um pouco dividido entre acção social e regulação do trânsito, gosto muito das duas coisas".

António Paixão, 46 anos, é um ícone da cidade, uma memória de outros tempos (apesar de tão novo), que o progresso tem vindo a apagar de forma luminosa, com semáforos. "Dança" na peanha (pequeno pedestal no meio do cruzamento), gesticulando indicações, qual maestro, para os milhares de "actores" que todos os dias atravessam o "teatro da vida" que é o cruzamento das Ruas de São Mamede e Escola Politécnica, bem no centro da capital. Crianças no caminho da escola, idosos às compras do almoço, ricos e pobres com destinos vários e ainda, claro, magotes de veículos que desesperam por chegar ao Largo do Rato ou, em sentido contrário, ao Príncipe Real. António Paixão é um dos dois últimos polícias-sinaleiro ainda activos.

O Agente Paixão até pode ter uma profissão em vias de extinção, porém tal não significa que ele próprio se vá deixar 'extinguir'. Não que o seu lugar na PSP esteja em perigo, ou que a Divisão de Trânsito, à qual pertence, vá ficar sem trabalho, longe disso. António Paixão considera-se um "polícia de proximidade", apesar de tal conceito estar mais associado a programas específicos como a "Escola Segura".

Decidiu, por isso, tirar a licenciatura em Políticas Sociais, na Universidade Aberta, logo ali ao lado do sítio onde todos os dias abre os braços ao trânsito, desde 1995. E a escolha não foi inocente, pois resulta do forte contacto social que mantém com a população local, não só a que mora por ali, mas também a que, por razões de trabalho, frequenta o Largo de São Mamede, onde as ruas se cruzam. "O polícia sinaleiro é uma figura carismática, recorrem a nós pelas mais variadas razões", resumiu o agente Paixão.

António Paixão acabou assim por corporizar o espírito do corpo de polícias sinaleiros, criado em 1927 e que chegou a ter 270 efectivos. António Maria Manuel, 68 anos, o polícia sinaleiro que antes exerceu o cargo no mesmo cruzamento, comprovou a forma como são encarados estes agentes: "Sempre fomos olhados por todos como sendo uma pessoa que ajuda". António Maria esteve 26 anos a orientar o tráfego no mesmo cruzamento de Paixão e reformou-se há 14 . Mora na zona e todos ali o conhecem e o cumprimentam."


in JN online, 19-12-2008




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"Horta do Zorate" é o blogue pessoal de Alberto João (Catujaleno), cidadão do mundo em autoconstrução desde 1958.