Destas mãos que falam, saem gritos d'alma, gemidos de dor, às vezes, letras com amor, pedaços da vida, por vezes sofrida, d'um quase iletrado escritor. Saem inquietações, também provocações, com sabor, a laranjas ou limões. Destas mãos que falam, saem letras perdidas, revoltas não contidas, contra opressões, das nossas vidas! (Alberto João)

domingo, 6 de outubro de 2024

COMO FAZER AMOR



 

— Então o que vamos fazer?
— O Amor.
— Tens a certeza?
Sim.
— Bem, vou despir-me.
— E por que estás a tirar a tua roupa?
— Então, para fazer amor.
— Quem te disse que temos que nos despir para fazer amor?
— Pois que eu saiba é assim que se faz.
— Não, essa não é a única maneira de fazer amor.
— Então como é?
— Apenas deixa a roupa vestida e conversemos até cansarmos, riamos por nada e por tudo, olhemos devagar até tentarmos decifrar.
Comigo não precisas de te despir de corpo, mas de alma, apenas olharmo-nos até ficarmos sem palavras, e ali, nesse instante em que as palavras são insuficientes para explicar o que sentimos, nesse silêncio infinito finalmente podemo-nos tocar. Percebes?
— Tocar-nos?
— Sim, tocar-nos com a ternura dócil de uma carícia que se expanda docemente até morrer num abraço.
— Ai, que lindo.
— Olha, deixa-me segurar a tua mão?
— Sim.
— Sentes? Essa é uma das maneiras de fazer amor.
É sobre isso.
Apenas deixa a roupa vestida e vamos conversar até cansar, vamos só olhar a boca, os cílios, os lábios por um tempo e se o beijo for necessário virá sem pedir licença.
Vamos conversar até conhecermos todas as nossas memórias, até sabermos os nossos segredos mais profundos, apenas deixa-me olhar para ti até ao mais extremo e requintado deleite, deixa-me ver a alma até o cansaço, até que estes olhos se rendam e me obriguem a baixar as pálpebras incitando-me a dormir.
— E tu vais forçá-los a ficaram abertos?
— Sim, para te olhar a noite toda... só a ti.

(Gabriel García Márquez)


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"Horta do Zorate" é o blogue pessoal de Alberto João (Catujaleno), cidadão do mundo em autoconstrução desde 1958.