Destas mãos que falam, saem gritos d'alma, gemidos de dor, às vezes, letras com amor, pedaços da vida, por vezes sofrida, d'um quase iletrado escritor. Saem inquietações, também provocações, com sabor, a laranjas ou limões. Destas mãos que falam, saem letras perdidas, revoltas não contidas, contra opressões, das nossas vidas! (Alberto João)

sexta-feira, 18 de outubro de 2024

'Vinha dizer adeus' - Rosa Lobato de Faria



 

Vinha dizer adeus, mas reparei
Que na faia do pátio era Setembro
Vinha dizer adeus, mas encontrei
Um livro na cadeira do alpendre
Vinha dizer adeus, mas as maçãs
Estavam no forno a assar e esse cheiro
Fez-me parar na porta das manhãs
A relembrar o nosso amor inteiro
Vinha dizer adeus, mas o teu cão
Veio lamber-me os dedos hesitantes
Vinha dizer adeus, mas vi no chão
A manta, ao pé do lume, como dantes
Vinha dizer adeus, mas senti fome
Ao ver a mesa posta para dois
Dálias e o guardanapo com o meu nome
Sem ter havido antes nem depois
Vinha dizer adeus, mas que surpresa
Apassionata… o último andamento
Como se tu tivesses a certeza
Que eu ia chegar nesse momento
Vinha dizer adeus, mas nesse olhar
Vi tanta solidão, tantos abraços
Tantas amendoeiras ao luar
Que me escondi, chorando nos teus braços
Vinha dizer que já não estou contigo
Que este amor singular já não é nosso
Vinha dizer adeus, mas já não digo
Vinha dizer adeus, mas já não posso!

(Rosa Lobato de Faria, in "Poesia", editora Guimarães, 2012)

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"Horta do Zorate" é o blogue pessoal de Alberto João (Catujaleno), cidadão do mundo em autoconstrução desde 1958.